terça-feira, março 20, 2007

EM DEFESA DA LIBERDADE

por Rodrigo Constantino

“The argument from intimidation is a confession of intellectual impotence.” (Ayn Rand)


Muitos conservadores religiosos, que antes elogiavam meus artigos, estão agora criticando minha “cruzada” contra as religiões e pedindo que eu volte a falar apenas de economia. Voltar? Gostaria de saber destes quando foi que eu falei apenas de economia. Será que esqueceram dos meus artigos condenando o fanatismo islâmico ou os ataques injustos a Israel na questão com a Palestina? Isso não me parece algo sobre economia. Será que fingem não ter visto meus artigos defendendo a liberdade de expressão quando o jornal que publicou desenhos injuriosos de Maomé foi duramente condenado? Será que não lembram de um artigo condenando o uso da religião para fins políticos pelo populista Garotinho? Será que é um tema apenas econômico condenar o coletivismo e a inveja presentes na seita socialista? Será que meus artigos contra o relativismo moral podem ser incluídos no rol de assuntos sobre economia? Será que um artigo criticando a visão romântica de “bom selvagem” de Rousseau pode ser classificado como assunto de economia?

Basta uma rápida visita ao meu blog para ficar claro que jamais falei apenas de economia. Defendo algo muito maior que a liberdade econômica. Defendo a liberdade individual, que envolve não apenas a liberdade econômica, mas também a liberdade de expressão, de opinião e de conduta, limitada apenas pela liberdade dos outros. O liberalismo é muito mais amplo que impostos baixos e pouca burocracia. Na verdade, esta postura dos conservadores deixa claro que não são defensores do liberalismo, não lutam de verdade pelas liberdades individuais. Pedem liberdade estritamente econômica, pois não ligam muito para a economia, já que falam com desprezo sobre os assuntos materiais. Mas naquilo que é do verdadeiro interesse dos conservadores, as questões de comportamento, eles defendem o autoritarismo estatal, o coletivismo. São um espelho dos socialistas, que defendem o autoritarismo estatal e o coletivismo naquilo que os interessa, que é o material. Raros são os que defendem a liberdade no sentido mais amplo, tanto econômica como na conduta da vida. Esses são os liberais verdadeiros, espremidos entre coletivistas autoritários de ambos os lados.

Autores liberais que influenciaram minhas idéias, tais como Humboldt, John Stuart Mill, Mises, Hayek, Ayn Rand e Milton Friedman, nunca limitaram seus escritos ao restrito tema da liberdade econômica. A liberdade econômica é fundamental, pois sem ela, não existe liberdade individual. Mas ela não é, nem de perto, suficiente. Os indivíduos devem ser livres para viver de acordo com o que defendem, contanto que não invadam a liberdade alheia. Ora, quando a religião invade essa esfera, é uma ameaça para a liberdade, e deve ser combatida. Quando um país proíbe o consumo de carne de porco porque uma maioria considera isso repulsivo por motivos religiosos, a minoria que não liga para tal religião tem sua liberdade tolhida injustamente. Quando um indivíduo não pode fazer um desenho ironizando a figura que quiser, porque agride a fé dos outros, sua liberdade foi solapada. Quando um Papa chama de “praga social” um segundo casamento, e exige que políticos católicos votem matérias de acordo com a doutrina da Igreja, o assunto não é mais apenas do interesse dos fiéis seguidores. Quando a Inquisição manda para a estaca um ateu apenas por ser ateu, isso não é diferente do ato de mandar para a câmara de gás um judeu no regime nazista. Quando a religião sai da esfera individual e passa para medidas concretas que afetam a liberdade dos outros que não compartilham das crenças desta religião, a liberdade individual está sendo ameaçada.

A liberdade de alguém não querer ver seu ídolo sendo criticado não é da mesma natureza que a liberdade de alguém poder criticar quem quiser, assim como a liberdade de alguém que quer roubar uma bolsa não é da mesma natureza que a liberdade de alguém que não deseja ter sua bolsa roubada. Como disse Mill em A Liberdade, "a única razão de se exercer o poder legitimamente sobre qualquer membro de uma comunidade civilizada contra sua vontade é prevenir danos a outros”. O que eu simplesmente não gosto não é motivo suficiente para coerção. O mesmo vale para a maioria. Como o próprio Mill diz ainda, “a humanidade ganha mais tolerando que cada um viva conforme o que lhe parece bom, do que compelindo cada um a viver conforme pareça bom ao restante”. Fanáticos religiosos são totalmente incapazes de compreender isso, e desejam impor aos demais a sua regra de conduta, que certamente é a correta, pois foi “revelada”. Tal fanatismo religioso é incompatível com a liberdade individual.

Como fica claro, não participo de cruzada anti-religiosa alguma, tampouco tenho como alvo específico a Igreja Católica. Não luto contra alguma coisa, mas sim por alguma coisa, e esta coisa é a liberdade individual. Logo, tudo que representar obstáculo a este fim será condenado. Seja a ideologia socialista, a doutrinação religiosa que invade a liberdade dos não religiosos, a pressão do “politicamente correto” que limita a liberdade de expressão dos indivíduos ou a própria ditadura da maioria, que ignora a liberdade das minorias de viverem de forma diferente, irei continuar condenando tudo aquilo que prejudica a liberdade dos indivíduos. Os conservadores não gostam disso. Aceitam que todo o restante seja criticado com argumentos e lógica, e até aplaudiam meus artigos nessa linha. Mas quando o alvo passa a ser sua própria religião, as emoções os dominam e a reação é totalmente passional, como um torcedor fanático que admirava muitas coisas no outro mas passa a detestá-lo quando descobre que ele torce para o time adversário. Passam a tentar me intimidar na base de agressões chulas e ironias bobas, tal como faziam justamente os socialistas quando estes eram o alvo do ataque. Querem me calar de qualquer maneira.

Trata-se, como diz Ayn Rand na epígrafe, de uma clara confissão de impotência intelectual, já que não possuem argumentos sólidos para rebater as críticas às suas crenças. Agindo como um rebanho bovino, não há muita distinção entre esses conservadores e seus inimigos socialistas. E aos que pedem para concentrar a munição em um lado apenas, lembro que o inimigo do meu inimigo não é meu amigo. Considero tanto conservadores fanáticos como socialistas igualmente perigosos para a liberdade individual. E minha luta é em defesa da liberdade.