terça-feira, maio 22, 2007

QUANTOS ZULEIDOS AINDA VAMOS TER QUE AGÜENTAR?

Transcrito do blog do Diego Casagrande


por Augusto de Franco


Você conhecia algum Zuleido? Nem eu. Quantos Zuleidos existem (operando a partir de suas boas relações com autoridades) no governo Lula? Quantos ainda vamos ter que agüentar?


Em artigo na Folha de São Paulo do início deste mês (“Confiança Zero”: 03/05/07) afirmei que o governo corrupto de Lula da Silva seria corroído por dentro, pelos seus próprios aliados... Disse, também, que não precisaríamos esperar muito: “basta que o (falso) governo de coalizão deste segundo mandato comece a funcionar para que apareçam os sintomas de putrefação”. E esses sintomas começam a aparecer.


Mas a PF - tão afiada na 'Operação Navalha' - não conseguiu ainda dizer de onde veio o dinheiro do falso dossiê, naquela aloprada operação que envolvia gente da mais íntima confiança (e convivência) de Lula. Qual era mesmo o nome da operação do falso dossiê? Ah! Nem nome tinha? Nem mesmo "operação" era? "Operação" só pode ser montada contra os outros?


Contra os lulopetistas, não? Quem já ouviu falar da 'Operação Waldomiro-Dirceu'? E da 'Operação Mensalão'? E da 'Operação Japonês 1'? E da 'Operação Japonês 2'? E da 'Operação Cuecão'? E da ‘Operação Mansão dos Prazeres’? Para nada disso teve operação? Foi tudo descoberto por acaso? Quantas PFs existem no Brasil?


Se não existe oposição para fazer tais perguntas, é sinal não apenas da traição de meia dúzia de caciques tucanos e pefelistas que pensam somente em suas carreiras. É sinal de que o sistema de partidos apodreceu, assim como boa parte das nossas instituições representativas. Não é a minha opinião: é o que estamos vendo todos os dias.


Não me venham dizer que a democracia é “assim mesmo”. Que a democracia não tem proteção eficaz contra o discurso inverídico, a cara de pau, a manipulação e o crime, conquanto – em contrapartida – permita que todas essas coisas apareçam à luz do dia e, assim, possam ser corrigidas “no processo”. Que “processo”, mané? Quem participa desse “processo”? E como? Apenas votando de dois em dois anos? Quá! Isso é puro auto-engano.


Da premissa (correta) de que a democracia que temos deva ser preservada contra os que querem autocratizá-la, manipulá-la ou corrompê-la (como fazem os lulopetista), não se deve derivar que não se possa modificar a democracia no sentido de radicalizá-la, quer dizer, de democratizá-la cada vez mais. A que está aí – conquanto necessária – revela-se francamente insuficiente. E por um simples motivo: o cidadão não tem canais efetivos para interferir nos procedimentos da política. Não tem. Pode-se fazer qualquer campanha para qualquer candidato a qualquer cargo que os Zuleidos continuarão lá. E muito pior do que um Zuleido (que não passa de um corrupto tradicional) é quem mimetiza o comportamento zuleidiano para roubar para o partido, para corromper em nome de um projeto de poder.


Estou dizendo que o corrupto lulopetista mais honesto – aquele que não bota um tostão do assalto, do desvio ou da “gatunagem altruísta” no bolso – é muito pior do que qualquer Zuleido. Muito pior, é claro, para a democracia. Nesse sentido, conquanto seja duro fazer essa afirmação (sobretudo para mim, que o conhecia pessoalmente e me dava bem com ele), o falecido Celso Daniel fez mais mal para as gerações presentes e futuras do que o indigitado Sombra.


Há fortes indícios ou suspeitas (devo falar assim para não ser processado?) de que, durante anos a fio, o PT desviou dinheiro das prefeituras que governou. Não que tivesse qualquer predileção por saquear o erário municipal, mas porque era o que tinha à mão. Foi com esse dinheiro, no início pouquinho, que conseguiu chegar aonde chegou. Foi com essa “acumulação primitiva”, feita por gente honesta, honestíssima até, que o partido se capitalizou e se profissionalizou. Gente que foi convencida de que esse era o único caminho para o poder. Gente boa, que passou a avaliar que a política infelizmente é assim, é o que é, não tem conversa; ou seja, de que o jogo é esse mesmo: é pegar ou largar. Assim, é preciso jogar o jogo ou cair fora. Pelo visto, entre abandonar aquele acalentado sonho de tomar o Estado brasileiro para dele fazer um instrumento de conquista de hegemonia de um grupo que quer se eternizar no poder e botar ‘a mão na merda’ (como disse outro dia aquele artista), os dirigentes optaram pela segunda alternativa.


Se alguém me pedir provas – no sentido jurídico do termo – de tudo isso, não as tenho. Nem me cabe produzi-las. Não estou acusando ninguém em juízo. Quem o fez, sustentando formalmente que havia uma sofisticada organização criminosa na direção do PT alocada no Palácio do Planalto, foi o Procurador Geral da República. Falo sobre convicções que formei a partir de evidências, indícios, sinais. Articulo opiniões. Construo argumentos que fazem sentido. Não faço investigações. Não sou da Polícia Federal. Não organizo operações com dinheiro público para desbaratar quadrilhas. A mim, me cabe apenas perguntar por que tais operações não foram organizadas por quem de direito.


Se algum petista ler este artigo e achar que não é bem assim, então de duas umas: ou é um bobalhão ou um desinformado. Nos dois casos, ele não saberá, mas eu sei o que estou dizendo. E digo. E reafirmo. Foi essa a grande transformação do PT (não a bobagem de aceitar o mercado, pois que só o fez em termos táticos, para preservar o que julga mais importante estrategicamente): sua conversão à realpolitik. Uma realpolitik exacerbada (e, como toda realpolitik, antidemocrática).


Hoje o PT – e seu chefe maior e único: Lula (só meia dúzia de basbaques na imprensa continuam acreditando na lorota e disseminando a idéia de que há um distanciamento entre Lula e o PT) – constitui uma força regressiva em termos democráticos. Regressiva e agressiva. Agressiva e muito perigosa.


Na América Latina estão em curso nesta quadra dois projetos autoritários. As “protoditaduras” de Chávez e seus aliados ou pupilos Evo, Correa e Ortega e as “manipuladoras” de Lula e Kirchner. Em essência, o projeto é o mesmo: autocratizar a democracia por meio do populismo (ou de um neopopulismo). A diferença entre os dois projetos fica por conta das diferenças de complexidade das sociedades em que se aplicam: na Venezuela, na Bolívia, no Equador ou na Nicarágua, estão sendo feitas algumas coisas que não são possíveis no Brasil e na Argentina. Por isso que, nesses dois últimos, não há propriamente “protoditadura” e sim “manipuladura”: a manipulação é a autocratização possível da democracia nas condições do Brasil e da Argentina. Mas as iniciativas são semelhantes: controle da imprensa (sob o eufemismo da ‘democratização dos meios de comunicação’), degeneração das instituições, aparelhamento do governo e das empresas estatais, banditismo (e corrupção) de Estado et coetera.


Como, no Brasil, Lula e o PT não têm força para governar sozinhos, precisam se aliar a gente que negocia com Zuleidos como se isso fosse a coisa mais normal do mundo (a política para eles é isso – e a democracia realmente existente permite que tal aconteça e se reproduza ao invés de ser corrigido “no processo”). Ora, os Zuleidos não roubam para causa alguma e sim para enriquecer. Mas isso, mais cedo ou mais tarde, acaba aparecendo, pois como é possível esconder aquela lancha maravilhosa, aquele carro de luxo, aquele apartamento de cobertura?


Bom, aí começa a encrenca que vai – como estou prevendo – levar o governo Lula à bancarrota. Desde, é claro, que a imprensa permaneça livre. Desde que exista gente que possa falar essas coisas que estou falando aqui sem ser morta, presa, processada ou intimidada de qualquer outra forma. E desde que não se confie mais nos líderes dos chamados partidos de oposição, os quais, em parte, estão imersos no mesmo lamaçal e, em outra parte, ou estão no mundo da política apenas para realizar suas carreiras pessoais, ou não têm idéia alguma de democracia na cabeça ou não têm juízo (ou tudo isso junto).


Mas mesmo que Lula e o PT venham a se estrepar (a despeito dos esforços que as oposições farão novamente para salvá-los, agora de um segundo naufrágio), isso não significa que o nosso sistema representativo melhorará. Não vai melhorar muito, a menos que haja uma reforma democratizante da política. Uma reforma que jamais será feita a partir de dentro, por iniciativa dos próprios interessados. Uma reforma que só acontecerá se houver pressão ambiental da sociedade, de fora para dentro e emergência, em quantidade suficiente, de inovações políticas, ensaiadas de baixo para cima.


Apenas com as instituições que existem e com as regras que estão em vigor, não tem conserto. Não há “processo” algum capaz de resgatar a política do buraco profundo e imundo em que caiu. Ou se meteu.

sexta-feira, maio 18, 2007

A VALORIZAÇÃO DO REAL

17 de maio de 2007 – transcrito do original postado no Diego Casagrande


por Rodrigo Constantino



“Sometimes, by examining too many trees, one loses sight of the forest.” (Martin Zweig)


O dólar rompeu o patamar psicológico de R$ 2,00 e ninguém sabe dizer onde ele vai parar. Alguns falavam em R$ 1,85 – o que parecia distante demais – e já estamos quase lá. No debate sobre o assunto, surgem muitas opiniões divergentes, mas poucos realmente analisam com calma o quadro geral. A visão míope faz com que muitos foquem somente na árvore, e ignorem a floresta. Não é razoável observar o que ocorre no Brasil sem levar em conta o que se passa no resto do mundo. O país não é uma ilha isolada, e o fenômeno em questão é sem dúvida mundial.


Comecemos levantando alguns dados para análise. Nos últimos 12 meses, o peso colombiano, por exemplo, se valorizou 21% em relação ao dólar. O dólar da Nova Zelândia subiu 16,9% no mesmo período, o koruna da Eslováquia subiu 16,8%, o baht tailandês valorizou 13,4%, o shekel israelense subiu 12,9%, o peso de Filipinas subiu 11,8%, o rupee da Índia valorizou 11,6%, o krona da Islândia subiu 11,6% e o guarani paraguaio valorizou 11%. O nosso real se valorizou cerca de 9% nos últimos 12 meses. Alguém ainda acha que a força da nossa moeda tem uma explicação isolada do que ocorre no mundo? Ou está mais claro que se trata de um fenômeno mundial, no qual as moedas emergentes estão se valorizando em relação ao dólar americano?


Os motivos para tal fenômeno são vastos. Entre as principais causas, eu destacaria a globalização finalmente abraçada pelos países emergentes, a revolução financeira e tecnológica, e a entrada da China e Índia no mundo capitalista. Há anos que o comércio mundial cresce bem acima da economia mundial. As nações estão trocando mais bens e serviços entre si, e isso é algo fantástico, pois cada um pode focar melhor em suas vantagens comparativas e obter mais barato dos demais aquilo que demanda. A enxurrada de produtos chineses no mundo tem essa explicação. Em trocas voluntárias entre indivíduos, ambos se beneficiam. O mesmo vale entre indivíduos e empresas de diferentes nações. Aumentando o escopo do ambiente de concorrência, há uma busca maior por eficiência, a produtividade tende a aumentar muito. Junte-se a isso a revolução tecnológica e financeira mais recente, e temos as principais causas desse “céu de brigadeiro” que tem dominado a cena nos últimos anos. Os países emergentes aprenderam muitas lições nos últimos anos. O foco aqui não é tratar das causas dessa bonança mundial, o que faria necessário um outro artigo inteiro. O objetivo é apenas mostrar que existe esse fenômeno, e que ele é mundial. O Brasil vai de carona, a despeito da ausência de reformas mais estruturais e necessárias. Poderia estar, sem dúvida, voando num patamar bem mais elevado!


O caso das reservas cambiais reforça essa tese de fenômeno mundial. Muitos falam do “excesso” de reservas acumuladas pelo Banco Central brasileiro, que já passam dos US$ 100 bilhões. Mas seria esse um caso particular do Brasil? A China, por exemplo, já possui mais de US$ 1,2 trilhão de reservas. A Rússia está chegando perto dos US$ 400 bilhões, Taiwan tem mais de US$ 270 bilhões, Coréia cerca de US$ 250 bilhões e Índia algo como US$ 200 bilhões. Cingapura, um país com cerca de 5 milhões de habitantes, possui algo em torno de US$ 140 bilhões em reservas. Em relação ao PIB, o Brasil tem pouco mais de 10% de reservas, contra 38% da Rússia e 47% da China. Será que é tanto assim mesmo? Será que é algo que tem ligação apenas com uma estratégia do nosso Banco Central? Uma vez mais, estamos vendo um fenômeno global, uma enorme quantidade de dinheiro buscando desenfreadamente alternativas de investimentos. Se existe um pouco mais de retorno esperado, mesmo com mais risco, vem uma chuva de capital. E o risco percebido vem sistematicamente caindo.


O “risco país”, que é medido pelo EMBI calculado pelo JPMorgan, tem experimentado quedas drásticas em todo mundo emergente. Não há mais gordura! Os bonds do governo brasileiro pagam atualmente apenas 148 pontos base acima do título do governo americano. Em outras palavras, o investidor recebe a mais somente 1,5% ao ano, aproximadamente, para assumir o risco do governo brasileiro em vez do americano. Mas novamente, não é um caso isolado do Brasil, tampouco mérito do governo Lula. A média geral dos mercados emergentes é de 158 pontos base, e isso inclui Argentina. A Turquia, por exemplo, paga apenas 153 pontos base acima do título americano, e o país está longe de ser um exemplo de solidez e credibilidade. Não resta dúvida de que algo estrutural e muito forte está acontecendo, e os fundamentos de fato mudaram, ficando mais sólidos no mundo todo. Mas parece haver excessos, e os investidores podem estar chamando urubu de “meu loiro”. Não há como saber se isso vai acabar mal ou não, e em qual prazo uma correção mais séria deverá ocorrer. Sabe-se apenas que os mais cautelosos ou pessimistas estão deixando de surfar uma onda gigantesca.


A bolsa do Peru, por exemplo, subiu quase 200% em dólares nos últimos 12 meses. A bolsa da Croácia subiu 115% no mesmo período, e a do Vietnã subiu 80%. O Ibovespa se valorizou pouco mais de 40% no mesmo período, em dólares. Um grande bull market contagiando o mundo todo! Os “animal spirits” de que falava Keynes parecem estar à solta, mas é importante frisar que há fatos concretos que justificam um otimismo geral. Se no caminho alguns vão se machucar, pagando caro ou entrando numa hora ruim, é impossível dizer agora. Os mercados financeiros não andam pari passu com os fundamentos da economia, pois são máquinas de antecipação dos eventos futuros esperados. Nem mesmo dá para afirmar por quanto tempo mais esses fundamentos vão valer.


Não é o objetivo aqui prever a direção dos ativos financeiros. Basta constatar que o mundo vive um momento único, raro e fantástico. E é nesse contexto que o dólar furou o nível dos dois reais. Chega a ser irresponsável falar nesse tema sem mencionar o cenário global. Alguns empresários aproveitam logo para pedir intervenção estatal – mais ainda! Em nome da “proteção da indústria nacional”, querem uma atuação ainda mais ativa do Banco Central, impedindo a valorização do real. Mas o câmbio não passa de um preço, um importante preço. Deve, portanto, ser livremente definido pelo encontro da oferta e demanda. Somente assim estará transmitindo corretamente todos os fundamentos existentes na economia, possibilitando uma tomada de decisão racional por parte dos diferentes agentes. Não é interessante tentar manipular artificialmente o câmbio. Não é possível segurar uma manada. Mais inteligente é se adaptar à nova realidade do mundo, sem medo das importações e da competição global. Se importar fosse ruim, os Estados Unidos seriam o país mais miserável do mundo. Que os empresários briguem pelas reformas estruturais necessárias para aumento da nossa competitividade, não pelo controle cambial! Não há motivo – nem instrumento adequado – para barrar a valorização do real. Trata-se de um fenômeno global.


PS: A esquerda nacional está ficando sem bodes expiatórios. O FMI já foi embora, a dívida externa está quase acabando e até os juros estão migrando para o patamar de um dígito apenas. Em breve, terão que reconhecer que é o Estado inchado a verdadeira causa dos nossos males. Se bem que não é adequado subestimar a criatividade dos esquerdistas em criar fantasmas...